A presidente Dilma Rousseff desembarca em
Buenos Aires nesta quarta-feira, em um momento de queda dos investimentos
brasileiros na Argentina e de redução no comércio entre os dois países, segundo
dados oficiais e de consultorias privadas.
Dilma participará da conferência "Argentina e Brasil, integração e
desenvolvimento ou o risco da primarização (das economias)", promovida
pela União Industrial Argentina (UIA). A "primarização" tem sido
citada com frequência nos debates empresariais e refere-se às exportações das
commodities, como cobre, ferro e soja, para os países asiáticos, especialmente
a China, sem valor agregado.
No terreno bilateral, empresários dos dois países apontam questões mais
urgentes, como as barreiras comerciais que teriam afetado o resultado da
balança comercial. Em 2011, este fluxo de comércio bilateral bateu recorde e
chegou a US$ 39,6 bilhões, de acordo com o Ministério brasileiro de
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).
A expectativa é de que este total fique em US$ 34,5 bilhões neste ano
(13% menor que no ano passado), afirmou o economista Mauricio Claveri, da
consultoria Abeceb, de Buenos Aires. "A redução pode ser atribuída ao
comércio controlado e ao menor crescimento das economias do Brasil e da
Argentina", disse.
Em 2011, a Argentina importou o equivalente a US$ 22,7 bilhões do
Brasil. Na mão inversa, a Argentina exportou US$ 16,9 bilhões para o mercado
vizinho. O comércio registrou então um superávit de cerca de US$ 5,8 bilhões em
favor do Brasil.
Neste ano o cenário mudou. As exportações brasileiras para o vizinho
caíram 20%, entre janeiro e outubro, e as vendas da Argentina para o Brasil
retrocederam 4,7%, neste mesmo período e na comparação com a mesma etapa do ano
passado, segundo dados do MDIC e da Abeceb.
Os produtos industriais brasileiros foram os mais afetados e a lista
inclui de automóveis, máquinas agrícolas a caminhões. No ano passado, porém,
ocorreram casos específicos, como a compra de aviões da Embraer pela companhia
estatal Aerolíneas Argentinas, que contribuiu para engordar as cifras do
comércio bilateral, como observou Claveri.
Neste ano, por sua vez, a Argentina vendeu menos alimentos, como o
trigo, para o Brasil, além também de automóveis e autopeças.
Números do Indec (equivalente ao IBGE na Argentina) e das consultorias
Ecolatina e DNI, de Buenos Aires, indicam que o país registrou forte queda em
seu comércio exterior, de forma geral. Em outubro, o superávit comercial
argentino foi de US$ 585 milhões, cerca de 50% inferior ao US$ 1,1 bilhão do
mesmo mês do ano passado.
"O Brasil foi o país mais atingido pelas medidas de controle de
comércio, mas não o único", concordaram as consultorias DNI e Abeceb.
No fim de semana, o jornal La Nación, de Buenos Aires,
publicou declarações do ministro da Fazenda, Guido Mantega, criticando as
barreiras comerciais argentinas. "Temos alguns problemas com alguns sócios
comerciais, por exemplo, a Argentina. Eles travaram nosso comércio bilateral,
um comércio importante, e isto está reduzindo principalmente a exportação do
setor industrial”, disse, durante encontro da Confederação Nacional da
Industria (CNI), em São Paulo.
Além disso, do lado do Brasil especula-se que poderia haver um
"desvio de comércio", com a entrada de mais produtos asiáticos e
menos brasileiros na Argentina. País de 40 milhões de habitantes, a Argentina,
com amplo setor de consumidores e empresas que precisam dos produtos
industriais brasileiros, costuma ser vista como destino natural das exportações
e até de empresas brasileiras.
partir da crise econômica
argentina de 2001, o Brasil vem sendo apontado como o líder dos Investimentos
Estrangeiros Diretos (IED) no país vizinho, atrás só dos Estados Unidos,
Espanha e França, que participaram ativamente das privatizações no país na
década de 1990. Estima-se, como publicou o jornal El Cronista, que
400 empresas brasileiras operem na Argentina atualmente.
No entanto, neste ano, a saída de investimentos diretos brasileiros para
suas filiais no país vizinho caíram 61,2% entre janeiro e setembro na
comparação com o mesmo período de 2011, aponta o Banco Central do Brasil.
De acordo com o levantamento, foram US$ 973 milhões no ano passado e US$
378 milhões neste ano – quase a metade do que foi enviado pelas empresas
brasileiras para o Chile, que registrou US$ 646 milhões.
Casa de câmbio em Buenos Aires; governo dificultou compra de dólares
Empresários atribuem a queda dos investimentos brasileiros no país
vizinho ao "cenário de incertezas" econômicas da Argentina.
"Ampliei meus negócios entre 2005 e 2011. Foi uma etapa próspera
para o empresariado local. Mas desde a aplicação da medida do governo de que
temos que importar para depois exportar, tenho tido problemas", disse à
BBC Brasil um empresário argentino que pediu anonimato. "Sou importador, e
não exportador. O consumo interno continua alto, mas as mudanças de regras são
desestimulantes para o investidor."
Claveri afirmou que o controle cambial também foi um dos responsáveis
pelo freio nos investimentos, já que ficou mais difícil para a filial enviar
dinheiro para a sede da empresa, no exterior. No entendimento da consultoria
DNI, "questões internas como a inflação e maior pressão fiscal sobre as
empresas" complicaram o cenário para os investidores.
As empresas brasileiras estão presentes em diferentes setores no país
vizinho, como energia, mineração e calçados. No entanto, como afirmou um observador
brasileiro, em alguns casos, como de calçados e de frigoríficos, existiam
planos de produzir na Argentina para exportar para o Brasil ou outros mercados.
Planos que também teriam sido afetados a partir de medidas oficiais.
O encontro da UIA, em um hotel na localidade de Los Cardales, na
província de Buenos Aires, conta também com a presença dos ministros das
Relações Exteriores, Antonio Patriota, e do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior, Fernando Pimentel, além de empresários dos dois países e
terá a presença da presidente da Argentina, Cristina Kirchner.
Dilma passará poucas horas na Argentina, em uma visita relâmpago que
prevê seu retorno para o Brasil na tarde desta mesma quarta-feira.
Fonte: BBC
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